Archive for 2007
Já está disponivel o 3º DVD do projecto "Até ao fim do mundo". Desta vez o filme de 50 minutos relata a viagem de 9800 quilometros que atravessou a Venezuela, Amazonia, Peru, Bolivia, Pantanal e Brasil. Cerca de 500 fotografias e informações sobre a rota, paises atravessados e participantes estão disponiveis nos extras do DVD.
O 3º DVD pode ser adquirido enviando um email para ateaofimdomundo@gmail.com
DVD Caracas - Machu Picchu - Rio de Janeiro 2007
Duas semanas depois de ter chegado do Rio de Janeiro, andava eu ainda meio desnorteado, recebi um telefonema da Estela. "Olá, Sou reporter de uma revista de motos nova, a 2Ride, não sei se conhece, ainda só saiu um numero, um amigo comum falou-nos do seu projecto e gostariamos de lhe fazer umas perguntas.... acha que é possivel??"
Possivel é respondi eu mas se querem saber algo sobre a ultima viagem vai ser dificil, ainda está tudo desorganizado talvez seja melhor daqui a um ou dois meses.... "Gostariamos de saber se poderia ser na proxima semana" disse ela decidida :) Está bem Estela, mas olhe que estou em défice aqui no trabalho, tenho de compensar os dois meses fora, se quiserem fazer a entrevista vai ter de ser aqui mesmo, numa hora de almoço e sem moto....não prefere fazer isso daqui a umas semanas... "Pode ser quarta feira que vem???"
E foi mesmo, mesmo sem muita vontade a coisa até correu bem, a Estela e o seu colega foram muito simpáticos e despachámos a coisa em meia hora no jardim da Gulbenkian. Entreguei-lhes um cd com algumas fotos não editadas e escrevi num papel o endereço do website; ...qualquer coisa liguem... A revista saiu este mês e o resultado ficou porreiro, a Floribela teve um destaque engraçado, é interessante ver uma modesta Honda dominator de 99 nas mesmas paginas que as BMW GS1200ADV ou as KTM da ultima geração,... ela merece ;-) ficam aqui algumas paginas...
Podem ler a reportagem em http://ateaofimdomundo.smugmug.com/Imprensa
Reportagem na 2Ride
Os caminhos que seguimos numa viagem nem sempre são fáceis, nem sempre são perfeitos, nem sempre são os melhores...
Nos últimos anos da minha vida fiz algumas viagens, em todas elas foi necessário ultrapassar vários obstáculos, em todas elas houve um principio, um meio, e um fim, e nesse fim todas as dificuldades ultrapassadas acabaram por nos fortalecer, nos ensinar mais uma lição na nossa vida, nos tornar pessoas melhores..... Nos ultimos 6 anos vivi uma viagem, uma viagem de onde esperava nunca regressar, uma viagem que esperava não ter fim...
sem ela nada disto seria possivel!
A verdadeira grande viagem!
Cada vez é mais difícil parar, cada vez é mais difícil regressar! As viagens de moto são uma experiência magnifica, temos um contacto directo com o meio que nos envolve, com os cheiros, com as temperaturas, com as pessoas, mas são tb uma viagem ao nosso interior, passamos longas horas por dia sozinhos em cima da moto, temos tempo para pensar, para cantarolar e para fazermos balanços de como vai a nossa vida. Não há ninguém para nos interromper, para nos desviar a concentração, talvez por isso as ultimas semanas destas viagens são sempre complicadas de digerir.
Tenho me perguntado cada vez mais quando é que vou ter coragem de não regressar, de continuar... de ficar por aqui... Afinal vou regressar para onde?? para o quê?? Para casa, mas que casa... é aqui que me sinto em casa... recomeçar, vou ter de recomeçar... e porque não recomeçar aqui....
O melhor é guardar para mim estes delírios vadios e continuar o diário da viagem que é para isso que serve este site, desculpem lá o desabafo!
Estou no Aeroporto do Galeão no Rio de Janeiro, chegámos ontem ao fim do dia à cidade maravilhosa. A ultima semana da viagem foi desgastante, muito desgastante, começamos a contar os dias ao contrario, os problemas lá da terrinha voltaram a preocupar-nos, voltámos a olhar para o relógio, para a agenda, para os compromissos, para o extracto do cartão de credito, para a conta bancária, para o trabalho.... e as noticias não são animadoras. Seja como for e como não há coragem para ficar... há que enfrentar o regresso e recomeçar! O Casimiro já foi, foi ontem com o seu ar tranquilo do costume, foi atrasado como tb é costume, teve de vir num voo de ultima hora de São Paulo para o Rio, conheceu os 4 aeroportos destas duas cidades e por esta hora deve estar a colocar a gravata para apadrinhar o casamento do seu irmão. Nós estamos há espera do nosso voo, há por ali um cyber point mas eu estou tão deprimido que não me apetece ver computadores à frente, vou escrever no meu velhinho diário e depois passo para o site quando tiver melhor. A chegada a São Paulo aconteceu à 5 dias atrás e a recepção foi como já é costume magnifica. O Silvio e a Joelma foram nos buscar ao Inicio da Marginal Tietê e guiaram-nos à "nossas" churrascaria onde os Verbenos já nos aguardavam. Decidir onde dormir é sempre uma decisão complicada por estes lados, a hospitalidade é tanta e tão genuína que temos de gerir cuidadosamente a coisa de forma a não magoarmos amigos. Para equilibrar a coisa optámos por dormir a primeira noite com os Verbenos e a segunda com os Ventura. A minha mana Milene veio de Jaraguá novamente para nos receber e desde a primeira hora integrou a comitiva Vadia. Depois de descarregar as bagagens e de um duche rápido na "Estalagem Rolf" seguimos para o Ibira Moto Point no centro da cidade onde os Desmo masoquistas e os Big loucos nos esperavam. Churrasquinho para aqui, cerveja e mais cerveja para ali fomos matando saudades de velhos amigos e conhecendo mais uns quantos novos. O povo brasileiro sabe receber, e quando o juntamos a isso a habitual hospitalidade motociclistica temos momentos que são difíceis de descrever. A noite acabou tarde e no dia seguinte custou a acordar, bateu a tal tristeza do "chegar ao fim" misturada com o cansaço da viagem, só depois do grande café da manha da Verbena é que nos sentíamos prontos para recomeçar a olhar para as motos. A viagem para a casa do Silvio onde vamos encaixotar as motos é sempre uma verdadeira "viagem", são 70 kms entre as duas casas atravessando toda a cidade de São Paulo. Esta cidade é realmente gigantesca, para alem disso está longe do mar, é plana e é quase impossível conseguir encontrar pontos de referencia que nos permita algum tipo de orientação. São demasiados trunfos contra para conseguir gostar desta cidade, não fosse a família e os amigos que tenho aqui e nunca colocaria esta cidade no roteiro da viagem. Vamos para uma garagem perto da casa do Silvio, é do Júnior que fez a amabilidade de guardar as grades da motos num armazém bem na frente desta garagem. As grades são iguais às que embalámos as motos em Lisboa por isso o trabalho até corre bem e em 3 horas temos as motos prontas. Vamos para o aeroporto começar a "burrocrasia"!! E fomos e, subimos e descemos e perguntámos a uns e perguntámos a outros e voltámos para casa sem nada resolvido. A única coisa que conseguimos saber foi que um despachante oficial pedia entre 1100 e 1300 dólares para tratar de tudo....caro.. muito caro! Fomos afogar as nossas frustrações no meio de amigos, o Ed e o Silvio organizaram um churrasco de despedida na casa do Júnior, o jardim está repleto de amigos, a picanha está deliciosa a cerveja estupidamente gelada... enfim mais um momento que vai ficar na memoria, Obrigado ao anfitriões do churrasco e a todos os amigos presentes. O_café da manhã da casa "Ventura" não fica nada a dever ao de um hotel de 5 estrelas, temos de ganhar forças para um dia inteiro no aeroporto e por isso esvaziamos a mesa em questão de segundos ;-) O dia foi chato como se esperava, papelada, pagamentos, corridas de guiché para guiché mas ao fim da tarde lá tínhamos poupado 700 dólares e estava tudo alinhavado. As motos forma transportadas durante a noite para o hangar de carga, há menos transito e menos movimento no terminal, o único inconveniente é que a Receita Federal já está fechada e vamos ter de voltar aqui amanha para terminar o processo de DSE - "Despacho de Exportação Simplificada".... simplificada dizem eles.....Voltámos a invadir a Pousada "Ventura" onde mais uma vez a Joelma e a Marcella nos receberam de braços abertos, para agradecer a hospitalidade fomos a um restaurante japonês, já começa a ser habito terminar a viagem com sabores orientais e sabemos que a Joelma tb é apaixonada por sushi! Nestas coisas é sempre melhor agradar à dona da casa do que ao dono :) se bem que a dona da casa é agora a Marcella. A manhã começa com boas noticias, a D. Fernanda da Tap em Lisboa já tinha enviados emails para o pessoal da Tap Cargo do Rio e de São Paulo, o Pedro Mendes já nos esperava e ensinou-nos todos os passos a tomar, só graças à ajuda dele e do Barboza da TapCargo de São Paulo foi possível despachar as motos em 3 dias. Tratar de toda a papelada é uma tarefa muito complicada e demorada, só possível com ajuda de quem conhece o meio. Temos de agradecer novamente toda a simpatia e profissionalismo de TODO o pessoal da Tap Cargo, seja em Lisboa, em Caracas, no Rio de Janeiro ou em São Paulo, todos foram magníficos e sempre nos sentimos apoiados. Obrigado mais uma vez, agora que ficámos clientes vão ter de nos aturar mais umas quantas vezes... Despachadas as motos temos de continuar a viagem, afinal ainda faltam os quilómetros até ao Rio de Janeiro. O problema é que com tantos atrasos só vamos ter um dia no Rio. É pena, quando preparei a viagem programei uma semana na cidade maravilhosa, queria terminar a viagem desfrutando da cidade e dos amigos que tenho aqui, queria passear pelos miradouros, caminhar na praia, passear nas lojas do Leblon, beber uma cerveja em Ipanema, namorar no calçadão, ir a um Motel daqueles..... enfim fazer um balanço da vida e tomar decisões. Lá estou eu outra vez.... desculpem. Despachar o Casimiro foi bem mais rápido do que despachar as motos, autocarro para o outro aeroporto, despedida sentida e... "liga se perderes o avião.." Nós alugámos um carro para a viagem para o Rio, eu queria alugar uma Combi, uma WV pão de forma, mas fui voto vencido e o resto dos vadios preferiram o ar condicionado e a direção assistida de uma Dubló, chatos! Já com o sol a descer optámos por ficar essa noite em Paraty, se seguirmos para o Rio vamos chegar de madrugada e não é boa ideia chegar à Linha Vermelha de madrugada, esta via rápida que atravessa a zona norte do Rio é rodeada por morros e favelas, é aquele Rio que não aparece nos postais, é preferível jogar pelo seguro e dormir a meio caminho. Paraty é uma pequena vila portuguesa do Sec. XVII encaixada entre a luxuriante Serra do Mar e as lindas praias da Baía de Angra. As suas casas são muito coloridas, a calçada é original da época, a cidade está repleta de pousadas, restaurante, bares e lojas de souvenirs, é um lugar caro, muito turístico mas também muito simpático. Para chegar aqui atravessámos a Serra por uma pista que há muito queria fazer de moto. A antiga rota do Ouro do tempo colonial atravessa a serra por Cunha, uma pequena aldeia bem portuguesa no cimo da montanha, aí começa o Parque Natural da Serra da Bocaima que desce até às baías de Paraty, a pista é um sucessão de curvas apertadas e enlameadas que descem dos 3000mts até ao nível do mar no meio de uma floresta tropical luxuriante. Era para ser o nosso ultimo troço de terra antes de terminar a viagem, acabou por ser na mesma só que em vez de ser de moto e de dia, foi de carro e de noite. Jantámos muito bem no Paraty13, um dos melhores restaurantes da cidade e a Milene guiou os vadios pelos bares de Paraty, eu não consigo esconder a minha tristeza, estou deprimido e não sou boa companhia de copos, apanho um táxi e vou cedo para a pousada, os outros perdem-se pelas ruas coloridas e animadas da cidade. Como resultado da noitada de ontem todos estão ainda em sono profundo, eu acordo com o nascer do sol e subo a rota do ouro quase até Cunha, queria ver as vistas, volto à pousada e ainda todos dormem, sigo para Trindade, uma praia muito conhecida da região, muito bonita por sinal, a agua está quente e a praia ainda tem pouca gente. Tenho de voltar aqui com mais tempo, a pequena vila de Trindade está cheia de pequenas pousadas e fica numa península rodeada de praias bonitas, tem um ambiente muito descontraído e parece ser bem mais calma que Paraty. No caminho de volta à pousada entro por alguns caminhos pouco utilizados e descubro "o" sitio! Praia, serra, temperatura tropical, floresta, mergulho, trilha, vento para velejar e uma casinha no meio disto tudo... quando é que eu vou ter coragem... ops desculpem lá outra vez! Volto à pousada, os vadios já estão prontos à minha espera, arrumamos a bagagem e apanhamos a BR101 na direcção do Rio. A estrada acompanha a costa e vai contornando as baías de Angra, no horizonte vêm-se muitas das 365 ilhas desta baía, muitas são particulares e todas são muito bonitas. Pelo caminho vemos tb os primeiros morros, aqui ainda não há favelas e podemos ver aquelas formações típicas dos postais do Rio, aqueles calhaus cinzentos escuros com o topo forrado com floresta. O Meau e a Gabi organizaram um churrasco lá na casa deles, estão à nossa espera desde a hora de almoço na companhia do Tulio, da Rô e de mais uns amigos do Rio. Nós só conseguimos chegar lá pelas 4 da tarde e ainda há picanha e cerveja gelada, é bom rever o Meau e a Gabi, eles são a família que tenho aqui no Rio e sempre nos recebem de uma forma magnifica, estou novamente em casa. Conseguimos dar com a casa deles na Barra, estivemos lá no ano passado e depois de tantas visitas ao Rio já me consigo orientar razoavelmente bem. Duche rápido e segue para a Lagoa, a cidade recebe os Jogos Panamericanos e está em festa, em todos os barzinhos e restaurantes há televisões que passam todas as modalidades em disputa. A conversa está muito gostosa e dura pela noite dentro, éramos para ir à Penha beber uma cerveja e sentir o berço do samba mas estamos muito cansados e amanha é o ultimo dia. Dormi mal, não que a cama fosse inconfortável, antes pelo contrário, eu é que estou inconfortável, não consigo apagar este sentimento de vazio que cada vez está mais forte. Tenho que confessar que quando o Tulio trouxe a sua Lc8 melhorei bastante de disposição, especialmente depois de saber que era minha durante toda a manhã. A Gabi está magoada no joelho e não vai poder ir com agente passear pela cidade. Só temos uma manhã, o check in é às 2 da tarde e antes ainda temos de entregar o carro alugado. O Meau, o Tulio, a Rô e o J são uns guias de primeira, levam-nos pela orla costeira, subimos a vários miradouros e terminamos a manhã com uns magníficos pasteis e um mergulho na Prainha. Tudo feito a ritmo de corrida que não há tempo para mais. Despedimo-nos a custo de todos, não basta este país ser escandalosamente belo, ainda tem as pessoas mais hospitaleiras e bem dispostas do mundo, amigos que se tornam família, família de que temos saudade logo que nos despedimos. Obrigado pessoal! Agora estou aqui embalado num cilindro de vidro que eles chamam "zona de fumadores" as lojas só aceitam dólares e não têm nada interessante, o avião está atrasado e parece que vai cheio, está a cair a noite, vamos ter 10 horas de voo e daqui a 11 vou ver se ainda tenho trabalho e recomeçar.Acabou!
Os últimos dias foram muito corridos, do Pantanal a São Paulo tivemos de acelerar de forma conseguir ter tempo para enviar as motos de volta à terrinha.
Saímos de Corumbá mais tarde do que o previsto para a ultima trilha da viagem, a transpantaneira! A pista é simples e fácil, é conhecida por ser frequente encontrar nas suas margens muitos dos inúmeros animais que fazem destes pântanos a sua casa.
Jacarés, capivaras, macacos, araras, papagaios e centenas de passarocos diferentes olham desconfiados para as motos que lentamente vão degustando mais uma pista de terra vermelha. O ritmo é muito lento e com muitas paragens, a cada curva mais uma fotografia, mais um animal, mais uma ponte, a sequência repete-se muitas vezes até que uma das pontes nos obriga a parar. Uma das mais longas pontes ruiu com a força das ultimas enchentes, avaliamos a situação, encontramos uma canoa que talvez dê, com paciência, todos juntos..... não, é melhor não! Temos pouco tempo para mais aventuras, volta para trás e vamos pelo asfalto.
A Floribela não gostou de regressar, a meio caminho o parafuso com que tínhamos reparado o apoio do amortecedor partiu (sim, aquele todo ferrugento que achámos no chão da oficina). Bem que o André tinha avisado que aquele parafuso não inspirava muita confiança, eu não tive em consideração os avisos sábios do nosso "ancião" e agora estava ali no meio da Transpantaneira sem suspensão traseira. Verificámos pouco depois que o maior problema não era o parafuso, o amortecedor quando perdeu o seu apoio encaixou de tal forma no braço oscilante que deixou tudo em tenção. A mola estava comprimida por cima do braço e o veio do amortecedor aparecia da parte de baixo, o parafuso quando partiu ficou preso no apoio e acabou por partir uma das alhetas de alumínio do amortecedor... Shiiiii isso já só sai daqui de reboque... disse o César.... Eu não concordei, afinal de contas não é uma moto qualquer, é a Floribela e eu passei muitas horas a olhar exactamente para esta parte... alguma solução havemos de encontrar.
O André e o Casimiro sacam das ferramentas, começamos a desmontar parte por parte e 15 minutos depois temos meia moto espalhada pela pista, um ferro longo consegue repor a mola no sitio certo e agora é só arranjar outro parafuso. A reserva do Artur voltou a safar a coisa, um parafuso original Honda mas longo demais serviria se o conseguíssemos cortar, umas anilhas de aço mudavam de lugar e faziam a vez da alheta partida.... mais alguns toques e meia hora depois a Flor já sorria de novo!
O César tinha ido avisar o Teles e resolveu seguir mais um pouco, seguiu tanto que só o voltámos a encontrar no dia seguinte ao jantar...
O resto do dia foi passado a desfrutar o Pantanal, mesmo rodando pela estrada de asfalto vêem-se muito animais, principalmente aves.
Apontámos ao Passo do Lontra, uma resort ecológica com passeios de barco para as regiões mais densas do Pantanal, digo apontámos porque nem parámos nessa resort, em vez dela escolhemos um Hosteling Internacional muito acolhedor e bem mais adequado às nossas bolsas.
O lugar é magnifico, simples mas muito bem localizado, os quartos são em palafitas elevados 2 metros acima do chão, só assim é possível manter os pés secos na época das chuvas.
Está um calor abafado e húmido, colocadas as tralhas no quarto preparei-me para saborear o por do sol durante um mergulho no rio, tinha perguntado à dona da Pousada e ela tinha dito "...pode ir tranquilo..." e eu ia. Ia, mas vi uma coisa que me deixou intrigado, uma espécie de tronco flutuava parcialmente no meio do rio, estranhamente seguia no sentido inverso ao da corrente...apontei a lanterna e brilharam dois berlindes numa das extremidade.... achei melhor refrescar-me com um duche!
Mais tarde reparei num placa na porta do quarto: "Tomar banho no rio é seguro desde que não esteja menstruada ou tenha feridas expostas! As piranhas são atraídas por sangue!"
A noite chegou rápido, desligaram o gerador, apenas escutamos barulhos na agua e na mata, apagaram as luzes, o céu estrelado revela toda a sua grandiosidade, acrescentamos Bob Marley à cena, o som agrada à Christiany, a capivara residente de olhos doces, o Casimiro deu-lhe muita conversa mas ela preferiu-me a mim!! Ganhamos mais uma amiga, mais uma noite para recordar, que bem que se está aqui!
O despertar foi cedo, vêem-se mais bichos de manha cedinho,
vamos num passeio de barco subindo rios cada vez mais estreitos. Pantanal adentro vemos centenas de jacarés, milhares de espécies de pássaros, macacos, iguanas, capivaras, veados...só faltou mesmo a sucuri.
4 horas depois voltamos à pousada e partimos na direcção de Campo Grande. A estrada é boa mas muito monótona, de um lado e do outro a paisagem é sempre a mesma, infinitos campos de cana do açúcar cortados por rectas sucessivas, é chato, dá sono!
Reencontramos o César durante o jantar delicioso na "Peixaria Pantanal", aceitámos a sugestão do "chef" e experimentámos vários peixes dos rios locais, foi uma boa escolha, o peixe é muito saboroso e sem espinhas.
!
Ontem o dia foi sem historia, a paisagem continuou monótona e não conseguimos descobrir nada de interessante no guia sobre esta região. Chegámos a SP mesmo a tempo do almoço, fomos recebidos ainda na auto-estrada pelo Silvio e pela Joelma e eles nos guiaram até ao restaurante onde os Verbenos já nos aguardavam. Já não é segredo que nos sentimos em casa quando entramos em SP, pessoalmente não gosto da cidade, é grande demais, é confusa demais, mas os amigos que temos aqui fazem com que seja uma das nossas cidades favoritas. Sobre a recepção em SP falo amanha, hoje, para terminar fiquem com uma foto do bicho mais estranho que vimos no pantanal!
De volta ao mato!
Estamos em São Paulo e está tudo a correr bem, já temos as motos embaladas graças à GRANDE ajuda da Milene, do Silvio, do Junior, do André da Verbena e de todos os amigos de SP.
Os ultimos dias foram muito movimentados, rodámos sempre até de noite para chegar aqui o mais cedo possivel, demorámos 2 dias desde o Pantanal, tivemos mais uns probleminhas nas motos mas foram resolvidos e amanhã esperamos conseguir deixar as motos no Aeroporto prontas a embarcar. Ontem dormimos na casa dos Verbenos e hoje vamos dormir na dos Venturas.
Não tenho muito tempo, nem para telefonar para a familia, nem para actualizar o site, temos chegado muito tarde e demasiado cansados para ir à net, aqui em SP há muitas coisas para tratar e pouco tempo, a cidade é enorme e tudo fica muito longe de forma que esta mensagem é só para fazer um ponto da situação rápido, amanha espero ter tempo para fazer um post mais detalhado e com algumas fotos.
Em São Paulo!
Estamos de volta ao Brasil, voltámos à civilização, a Bolívia vai deixar saudades mas aqui estamos em casa! Temos picanha, churrasco, cerveja realmente gelada e belas vistas de novo.
Os últimos dias na Bolívia vão ficar na memória, tínhamos poucas informações sobre a pista de Santa Cruz até à fronteira com Brasil, sabíamos apenas que era uma rota dificil atravessando uma região muito isolada e desértica, o Chaco Boliviano.
Saímos de Cochabamba já tarde, a avaria do Teles foi difícil de resolver, deveríamos abrir a cabeça do motor, identificar a fuga e substituir junta e vedantes das válvulas, o problema é que aqui não existe peças nenhumas para esta moto e a solução foi uma simples rosca no buraco da fuga e parafuso a tapar!Ligámos ao André Ettiane e ficámos a saber que em Corumbá haveria juntas e vedantes para este motor, o Charlie da oficina com o mesmo nome em Cochabamba foi o artista da rosca. Testámos a coisa, vimos se aumentava a pressão, não... Ok segue viagem, em Santa Cruz avaliamos de novo a situação.
Outra situação que nos preocupava eram as noticias de bloqueios enormes nas estradas principais da Bolívia, tinha começado um exactamente no dia em que saímos de La Paz e por pouco escapámos, algumas horas depois e ainda lá estaríamos, o bloqueio dura já há 4 dias e ninguém consegue sair da capital para o sul do país. Tínhamos algumas noticias contraditórias que anunciavam bloqueios tb na estrada para Santa Cruz e foi com alguma preocupação que nos fizemos à estrada.
A reparação funcionou, não perdeu mais óleo (pelo menos por aquele buraco), não encontrámos bloqueios na estrada e fomos degustando lentamente a descida dos Andes. No inicio da descida surgem as primeiras nuvem nos cumes, sentimos a humidade a aumentar,
a aridez dos 4000 metros desaparece repentinamente depois de um cume e em vez de montanhas nuas vermelhas surge uma vegetação densa que vai aumentando conforme descemos. Almoçamos numa barraca de beira de estrada e começamos a retirar as camadas de roupa, a temperatura já é mais agradável, estamos a pouco mais de 1000 metros. A estrada é bonita, tem muitas partes de ripio grosso sinalizadas como áreas de instabilidade geológica, como o asfalto devia passar a vida a quebrar optaram por esta solução, uma boa solução apenas algo desconfortável para os motociclistas que se cruzam com camiões.
Chegámos a uma pequena cidade chamada Montero a 40 km antes de Santa Cruz, se continuarmos vamos ter de conduzir de noite e descobrir um hotel barato numa cidade grande e cheia de transito, não gostámos muito dessa experiência em La Paz por isso decidimos ficar por Montero.
O dia seguinte foi o primeiro da travessia do Chaco Boliviano, mais uma vez estão a construir uma estrada de asfalto na direcção do Brasil, mais uma vez a pista antiga está destruída pelas obras e pelos camiões. Agora o calor já aperta, estamos a apenas 200 metros de altitude numa planície sem fim, sopra um vento fortíssimo faz lembrar o do Sahara ou o da Patagónia, vem em rajadas que nos empurram para aquela parte da pista cheia de pedras grandes, ao lado temos espectadores atentos à espera do pior.
A pista tem degraus e buracos enormes, partes de fesh fesh (tipo pó talco) profundas e com pedras lá em baixo, as motos sofrem muito, tudo treme, as suspensões batem no fundo muitas vezes, de todas as partes da moto surgem sons de pancadas fortes no metal, de tempos a tempos toco nas malas só para ver se ainda lá estão.
Finalmente as obras acabam e pela frente surge a pista antiga, bonita, vermelha e ladeada por uma vegetação mais alta e verde. A planície dá lugar a um carrocel de subidas e descidas gostosas, as rectas intermináveis dão lugar a curvas bem desenhadas, o sol começa a cair, a temperatura está perfeita, bate uma brisa fresca na cara.... é por momentos deste que não tenho duvidas que a moto é o veiculo ideal para viajar.
Dormimos em San Jozé de Chiquitos, uma pequena cidade saída de um filmes de cowboys. O lugar foi fundado em 1520 por uma missão franciscana e pouco deve ter mudado desde então, não existe asfalto em toda a cidade, todas as casas tem um alpendre em madeira como aqueles do wild west. Espalhados por toda a cidade estão muitos Mormons de origem alemã, loirinhos de olho azul com calças manufacturadas, suspensórios, chapéus de palha e olhar desconfiado. Realmente este é o lugar perfeito para eles, encaixam neste lugar parado no tempo como ninguém!
Para nós é noite de dormir cedo, enganei os vadios e disse-lhes que amanha os 450 kms que faltam até à fronteira são infernais e duram normalmente 11 horas de viagem (na verdade as informações que tenho é de metade disso, mas é a unica forma de por o Teles e o Casimiro em cima da moto antes das 9). Assim saímos com o nascer do sol e pelos meus planos chegamos ao Brasil depois do almoço a tempo de passar as demoradas fronteiras e comer uma picanha em Corumbá.
Não foi bem assim, realmente saímos com os primeiros raios de sol mas 30 kms depois a Téneré do Casimiro encosta à berma sem rolamentos atrás. Malas fora, roda fora toca de analisar o problema, diagnóstico: rolamento destruído, roda bloqueada!! O Casimiro e o Teles não trazem rolamentos de substituição, os que o César trás não são desta medida... são as dominators que salvam o dia contribuindo cada uma com um rolamento para a reparação.
Bom saber que Ténerés de Dominators levam a mesma medida de rolamentos na roda de trás, bom saber tb que o Casimiro continua com a sorte do costume. Aproveitamos a paragem para olear as correntes e fazer uma inspecção básica, eu reparo que o parafuso que segura o amortecedor ao braço oscilante partiu e ameaça partir as bielas do prolink. Reparo tb que pela quantidade de lama e pó o parafuso já anda assim há uns dias por isso tenho fé que ele há-de aguentar mais umas horas, seguimos viagem.
Em vez de pista temos asfalto nos primeiros 100kms até Roboré, é mais chato mas dá para ter uma outra perspectiva da paisagem. Agora as montanhas aumentam de altura, são parecida com os Tepuys da Venezuela mas sem tanta vegetação, a estrada nova serpenteia por um canyon enorme entre estas elevações, é bonito, afinal o Chaco daqui não é chato!
Em Roboré abastecemos as motos e enquanto as Yamahas foram procurar óleo as hondas foram procurar uma oficina para substituir o parafuso. A manobra foi mais complicada por três razões; primeiro porque eu sou preguiçoso e não quis desmontar as malas para aligeirar o peso, segundo porque o parafuso que eu encontrei nos sobresselentes é curto, vamos ter de fabricar um, e terceiro porque a oficina tem apenas um torno que não funciona e não tem serrote de metal....
O mestre André e a sua serra maravilha reciclaram um parafuso ferrugento do refugo da oficina e em meia hora estávamos a almoçar pollo num restaurante nas margens de uma ribeira.
Os 450 quilómetros que nos separavam da fronteira foram devorados com muito prazer, sem obras e com pouco transito a pista continua com as curvas e o carrocel. Imaginem uma pista de terra vermelha, um vento lateral ligeiro que afasta o pó do da frente, o pneu traseiro já está nas ultimas e a cada curva resvala ora para um lado ora para o outro, a moto funciona perfeitamente, soa melhor ainda, a paisagem é bonita e de 50 em 50 kms encontramos uma aldeia com um barraco onde a única coisa que se pode comprar é cerveja fresca....enfim idílico!! Lembrei-me do meu amigo Zinga, ele ia gostar de estar aqui, um gole à sua saúde!! Estávamos nós em pleno transe a devorar a pista quando na ultima aldeia aparece-nos uma multidão. Camiões parados, troncos na pista, mulheres e crianças no meio da rua. Bloqueo!! Bloqueo!! Ok!!
Motos paradas, tudo parado, as senhoras é que mandam no Bloqueo, querem agua e luz nas casas da aldeia, chamam os políticos de corruptos e estão muito mal encaradas. Simpatizamos com a causa, juntamos as motos ao bloqueio mas ao fim de uma hora, sem agua, sem cerveja, sem cigarros começamos a perder a motivação sindicalista. Senhora podemos avançar?.... Non, se quedan aqui um ratito más! O André e o Teles têm mais sorte, perguntaram a uns camionistas que obviamente disseram que podiam avançar, quando as senhoritas perceberam eles já estavam longe. A mim bloquearam-me sentadas na frente da moto, umas muito mal encaradas outras mais bem dispostas já diziam que eu podia ficar por lá e casar, ofereceram cama, comida e roupa lavada... e 5 filhos pra criar!!
De repente chega um policia ainda mais mal encarado, afasta a cadeira na frente da moto e diz: Sigue!!, eu olhei a medo para as senhoras que me diziam adeus e segui!
Com esta historia perdemos 2 horas e o sol já começava a alaranjar, acelerámos mais um pouco para fugir dos camionistas kamikases que tinham ficado no Bloqueo e em 50 minutos devorámos os 120 kms que faltavam, as obras recomeçaram mas nem isso nos fez abrandar! Isto de pilotar de noite na pista esburacada tem algumas vantagens, quando deixamos de ver os buracos e as armadilhas rodamos mais depressa, parece tudo mais fácil.
Chegámos à fronteira 10 minutos antes de fechar, isto a do Brasil porque a da Bolívia já tinha fechado. Tanta pressa para nada, temos de tratar da importação temporária para o Brasil só amanha! Seguimos para Corumbá sem carimbos no passaporte e com o consentimento dos guardas da fronteira, parece que perceberam pelas nossas caras que precisávamos de uma picanha.
Agora estamos em Corumbá, passámos toda a manha a tratar de papelada nas fronteiras e deixámos as motos numa lavagem e revisão, já são quase 5 da tarde e já não vai dar para ir hoje para o Pantanal, vamos amanhã! Ontem brindámos aos amigos que gostariamos de ter aqui connosco, o Martins, o Galego e o Luis Lourenço fazem falta eles iam gostar muito destas pistas, eu ja decidi quando eles vierem eu venho só para mostrar o caminho :).
Estamos bastante atrasados em relação ao previsto, temos de chegar a São Paulo na quarta feira sem falta para embalar e despachar as motos. Temos quinta feira para fazer isso, sexta o Casimiro já volta e no fim de semana a Aduana está fechada. O que salva os nossos contratempos são novamente os amigos, o Sílvio está imparável em Sampa, já conseguiu as grades para as motos e tem tudo preparado por lá, era para vir com a Verbena e o André até Bonito para rodarem connosco de volta a SP, mas já nem sabemos se temos tempo para ir a Bonito alem disso para eles seriam 2600 kms em 3 dias... se bem que me daria uma grande prazer terminar a viagem na sua companhia, não lhes vou fazer essa maldade.
Hoje as fotos são da autoria do Teles!