Fluindo pelas montanhas Sul Africanas

O chão da pista brilha com o sol rasteiro, não serão certamente diamantes mas não deixa de ser estranho pisar um chão “estrelado” no meio deste deserto. Sigo pela pista a Leste da zona dos diamantes, entre um planalto ressequido que se estende até ao mar e monólitos de calhau enormes que me indicam o caminho para sul. São o inicio do Fish River Canyon, o cartão postal do sul da Namíbia. Um desfiladeiro gigante que se estende por largos quilómetros até se juntar ao Orange River, o rio que faz de fronteira natural com a África do Sul. A luz não ajuda, está de frente e não me deixa tirar fotografias que consigam dar uma percepção da dimensão desta enorme falha criada por milhares de anos de erosão. Há por aqui uma caminhada de 5 dias e 4 noites que desce pelo meio do Canyon até Ai Ais um oásis alimentado por aguas geotermais que aquecem o Fish River. Este lugar, descoberto por pastores Nama à vários séculos atrás alberga agora uma requintada resort com piscinas termais, paredes meias com inscrições rupestres nas paredes do canyon. Eu não tenho tempo para a caminhada e em vez de 5 dias demoro 3 horas a descer pela margem do canyon por pistas de areia e gravilha, douradas pelo sol que já se quer ir embora. A paisagem toma formas estranhas, alienigenas, salpicada com estranhas árvores de aloé que parecem saídas do período jurássico. Chego mais uma vez com o ultimo raio de sol, tenho aproveitado todos do dia, das 5h30 da manha até às 18h30 não deixo fugir um só raio do astro rei. Entre acampar por $12 ou dormir num quarto por $34 escolho a segunda opção, não me apetece montar a tenda e um bom pequeno almoço buffet é sempre um bom investimento. Retemperado por um mergulho matinal nas piscinas geotermais e um grande pequeno almoço, continuo o meu caminho na direcção da fronteira da África do Sul. Não levo grandes planos de onde ficar nesta noite, se me agradar fico, se não me chamar a atenção sigo. Paro para por gasolina no primeiro posto sul africano e fico intrigado com uma bandeira portuguesa. Entro na loja do posto e deparo com um plasma a emitir o Natal dos Hospitais. Quem me recebe é o Sr Manuel, um madeirense sportinguista com uma simpatia extraordinária que insiste em que almoce por ali, apesar de serem ainda 11 da manha. Não me deixa dizer que não e em pouco mais de 10 minutos tenho um bifão na minha frente acompanhado por uma garrafa de vinho. Insiste para que fique ali umas semanas, “Não paga nada” diz ele, “vai comigo a Port Nolloth ver a exploração de diamantes, dorme come e bebe e não gasta um tostão. A verdade é que bem que gostaria de ter mais uns dias para ficar aqui com o Sr Manual, ele é daqueles amigos instantâneos que encontramos nas viagens, a sua pureza e energia positiva fazem-nos sentir genuinamente bem vindos e muito confortáveis. Despeço-me com pena deste madeirense de bom coração e volto à estrada. Nada muda, durante mais 300 kms na estrada que atravessa a região dos diamantes sul africana, deserto e mais deserto. O asfalto cansa muito, muito mais do que as estradas de terra, especialmente estradas monótonas como estas onde curvas largas interrompem rectas com muitos quilómetros. Ao fim de algumas horas surgem finalmente montanhas, água e uma côr verde vibrante. São vinhas, enormes e viçosas vinhas alimentadas por um engenhoso sistema de canais de agua que fazem chegar vida a este lugar seco. Num dejá vú estranho reconheço Trás dos Montes nesta paisagem, um chão pedregoso e áspero, uma temperatura amena mas seca e agua com fartura. Sem duvida uma boa receita para vinho de qualidade! Começa aqui o Cederberg Widerness Area, um lugar habitado por babuínos e leopardos que partilham grandes montanhas de pedra. Estou definitivamente cansado do monótono asfalto e sem grandes planos desenho um azimute mental daqui até ao ponto mais sul de África, Cabo Agulhas. Seguir esse azimute implica sair definitivamente das estradas principais e ir explorando o interior montanhoso. Foi uma boa escolha, uma pista de terra fluí durante uns 200kms por vales enormes rodeados por grandes picos. Parece que estou nos Pirenéus em plena primavera, com o sol pelas costas e uma brisa fresca a entrar pelo casaco... sem pressas vou saboreando cada vale, cada passo de montanha. Chego ao Oásis Cederberg, um pequeno hostal que mesmo não aparecendo nos guias me foi muito recomendado por vários viajantes com que me fui cruzando. O lugar ficou famoso pelo seu grande bife e pela hospitalidade de Gerrit o seu proprietário, alem disso fica no meio de uma pista magnifica que cruza todo o parque natural. Assim que paro confirmo a sua fama, Gerrit vem ao meu encontro e mesmo sem ter ainda saído da moto já tenho janta marcada e quarto pronto. Estão lá o David e a Angela com duas KLR que me confirmam que estou a meio de um dos roteiros mais apreciados pelos motociclistas Sul Africanos. Termino mais um dia na conversa com este simpático casal de Cape Town. É impressionante como energias semelhantes aproximam imediatamente as pessoas, sem hesitações e apenas passado alguns minutos de conversa eles convidam um barbudo desconhecido e empoeirado a para ficar em sua casa em Cape Town. Mas antes tenho de ir ainda a Cape Agulhas, vou deixar-me fluir pelas estradinhas do interior até ao ponto mais a Sul de toda a África e ver onde o Atlântico se junta ao Pacifico.

Comentários

  1. Miguel Casimiro12:23 da tarde

    :::::::)))))))))))))!!!!

    ResponderEliminar
  2. Sofia Nunes2:52 da tarde

    Carlos, grande viagem! Por aqui vamos sonhando! um grande beijinho! :*

    ResponderEliminar

Enviar um comentário

Mensagens populares